sábado, 21 de janeiro de 2012

This light holds so many colours

A coisa que eu mais adorava era a Primavera e a luz com que banhava as árvores do Marquês. Era chegar a casa da minha avó e entrar a correr, saltar-lhe para o colo e contar baboseiras. Tudo o que eu dizia era, para ela, adorável e engraçado.
Às vezes íamos para o jardim beber refrescos, eu e ela e a minha tia e a minha mãe. E lá ficávamos sentadas a conversar e a rir. Sempre adorei as histórias delas, antigas, as coisas engraçadas que lhes tinham acontecido. Sempre adorei ouvi-las a rir. Sempre achei que aquilo era a eternidade. No jardim da minha avó havia um limoeiro, uma pereira, muitas rosas, que eram as favoritas dela, várias outras flores e uma antiga roda gigante, que já tinha sido, em tempos, para tirar água de um poço já inexistente. Eu brincava ali, já a minha mãe o tinha feito. Fazia dela um baloiço.
Às vezes íamos para o quarto dela experimentar roupa e jóias, passeavamos até ao terraço dela, falávamos de tudo. Sempre as quatro ou, quando eu tinha segredos,só as duas, porque era sempre ela a primeira a saber.
Hoje essa casa maravilhosa é minha, aquele quarto é o da minha mãe e a pereira foi abatida, estava velha e doente. Como a minha avó. Mas já não é um prazer lá entrar. Todos os dias entro na sala na esperança pueril de a ver a piscar-me o olho e a sorrir para mim. E não havia sorriso mais bonito.
A última coisa que ela me disse foi que eu era linda e inteligente. Parecia uma criança a rir-se toda para mim, ainda tão bonita. Sempre linda. Tinha tanto orgulho em mim e tanta esperança e no entanto, apenas por uma questão de dias, nunca soube que eu ganhara a sorte grande, que ia para Bruxelas como tantas vezes sonhei com ela.
Não sei arrancar esta angústia de mim, esta dor inerente a tudo o que faço e digo. Tudo é novo de repente e doloroso. Tudo isto não sou eu.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

The moment that you stepped into the room, you took my breath away

Gosto da sensação de encantamento viciante que se tem sempre que se experimenta alguma coisa pela primeira vez e se gosta muito.
Às vezes sonho que o tempo não passou e que continuo a passar férias loucas em Lisboa e apenas a disfrutar de uma inocência idiota que acha que aquele é o momento de viver e que realmente me faz feliz. Não é assim mas ainda bem, porque a minha vida tem agora uma ternura e uma quantidade de amor que não tinha então e que eu nem sabia importante.

Às vezes também sonho, mais acordada até do que a dormir, que a minha avó não morreu. Que nunca tive de juntar a um substantivo tao pequeno (mas de tão grande significado) tal verbo tão gigante quanto o vazio que me deixou. Não me digam que há a memoria. Não me digam nada. De que me serve tudo isso se não há um olhar e um amor tao incondiocional como este era. É. Não me digam nada porque nada há a dizer, a memória é gigante mas o vazio é incomportável.

Encontrei a cidade onde quero viver. A cidade perfeita e mais maravilhosa que existe. Ou para mim é, porque é a minha cidade.
Estou em crer que Barcelona, quando as pessoas estão a dormir, sai às suas próprias ruas para dançar e envolver-se na sua magia, para regozijar-se da sua beleza, da sua arte, do seu cheiro, da sua cor.
E bem pode fazê-lo.

sábado, 13 de novembro de 2010

Outrora

"Às vezes ela ia até à janela, voltava para dentro, mudava de roupa e saía. Às vezes nem tinha destino. Só tinha esperança de o ver, ou que ele a visse a ela. Ela imaginava que se talvez ele aparecesse uma vez que fosse no meio das pessoas que passavam por ela sem a ver ela pudesse sentir tudo outra vez. E era tão dificil ver todos os dias as mesmas caras a sorrirem por detrás dos jornais cinzentos e dos quentes copos de vinho sem nunca (re)ver aquele sorriso. E porque não? Ela não era já a mesma pessoa, nunca mais voltaria a ser. E tudo porque agora nos dias de chuva ficar em casa já não fazia sentido. Só a música fazia sentido agora.
Ela voltava para casa debaixo da chuva negra e fria que fazia aquelas árvores tão bonitas e aquele caminho tão familiar. E continuaria a fazer o mesmo trajecto todos os dias, às horas que lhe apetecesse. Estar em casa era tão insuportável como estar na rua.
E de novo a janela. E os velhos amigos que arrancavam notas e palavras ao pensamento em voz tão elevada que não se pudesse ouvi-la chorar. Revia mentalmente todos os passos e palavras tão eternas quanto possível, tão efémeras quanto os dias gelados de Fevereiro. Tão eternas quanto efémeras. "If you go your way, I´ll go your way too".
E a música,e os passeios e a vida. E aquela janela que já fora branca em tempos mas que agora era cinzenta.
Um cinzento desmaiado. "

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

"18 seconds before sunrise"

Da minha cidade, dizem que é cinzenta. Eu acho-a colorida. Com vários tons de castanho, vermelho, bege, branco, negro e amarelo.
É uma cidade que, como todas as cidades com mistérios e infortúnios, tem de ser lavada todos os dias pela chuva gelada batida a vento e que se enfurece algumas vezes.
Mas a gente habitua-se, embora não sem se queixar, e enche-se de roupa pesada e quente e guarda-chuvas que se vão deixando ficar pelas esquinas esventrados e esquecidos.
Então o metro arrasta-se vagaroso por entre as folhas encharcadas que vão caindo para os trilhos. E a gente nunca deixa de correr porque os infortúnios não são só da cidade, são das pessoas. E as pessoas aqui nunca têm tempo.
E mesmo assim ela continua linda. E às vezes nem se percebe bem como é que é possível. Talvez porque a falta de tempo não permite olhares mais demorados sobre ela.
É a minha cidade e às vezes atrevo-me a pensar que é só minha. E que ela se mostra só para mim. E às vezes pisca-me o olho:)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A liberdade é uma maluca que sabe quanto vale um beijo...

O Kalu é que a sabia toda. A vida é uma puta. Mas é uma puta moderada. É mais no sentido em que é difícil. É. Mas e então? Ora porra, o caminho é para a frente.
Mas se "somos escravos do que precisamos" então porque é que não fazemos tudo o que podemos para ser felizes? Dizer que a felicidade é um mito é um mito por si só e talvez seja pela quantidade de muco que tenho acumulado no cérebro neste momento mas parece-me claro. "Quem perdeu há de ter mais cartas para dar". Afinal não era o Kalu que tinha razão. Era o Palma. Esse grande poeta. E pelos vistos o álcool fá-lo ver a realidade mais transparente. Eu também a vejo...
Eu tenho a liberdade para mudar a minha vida toda, para virar tudo do avesso, tenho. E ninguém ma tira.

"E eu sei que essencialmente isso se deve a esse passo inseguro e ao paraíso no teu olhar!"...
:)

sábado, 25 de setembro de 2010

Hello Goodbye

Adoro o primeiro dia do ano que temos de nos levantar da cama pouco depois de nos deitarmos para irmos buscar um cobertor. O Outono é uma estação maravihosa, talvez a mais maravilhosa de todas. Pela cor, pela magia, pelo friozinho agradável e pelo sol quente de depois de almoço a dar nas costas.
O Outono faz-me sempre prometer que este ano vou ser feliz. Mas no início do Outono tenho quase sempre um ataque de choro incompreensível, incontrolável, incontornável. Não há nenhuma estação de que custe tanto despedir-me como do Verão. Talvez por isso, quando o Outono começa a despir as árvores e as casas, eu também tenha de o fazer.

E então tudo passa, tudo se cura, lava-se tudo e é-se feliz. E corremos todos os dias para o metro, saltamos passadeiras e pequenas poças de água, ocasionalmente apanhamos uma chuva inesperada. E levamos música nos ouvidos. E lemos livros no metro. E trabalhamos e estudamos. E à noite deitamo-nos no sofá, quentinhos, enrolados em mantas, copos de vinho e conversas telefónicas intermináveis. E não choramos mais porque está tudo bem e tudo se renova.

Todos os anos é assim. Invariavelmente.

domingo, 12 de setembro de 2010

Eu continuava a querer ser uma escritora qualquer...

Sinto que perdi o dom, o dom de escrever, se alguma vez existiu parece ter-se ido. Não sei o motivo. Talvez porque quando não tinha nada, tinha isso, e agora estou a recuperar-me aos bocadinhos. Não acho que uma pessoa tenha de estar infeliz para escrever porque isso não faz qualquer sentido. Acho é que às vezes ter muita coisa na cabeça ajuda. Eu tenho sempre muita, é certo, mas gosto mais de guardar para mim...
Eu queria ser escritora, lembram-se? É ainda o meu sonho, mas ainda agora tenho um certo pudor em partilhar certas palavras com vocês, não assim tantos leitores mas sempre tão amigos.
Como posso atingir qualquer tipo de perfeição se essa mesma perfeição já foi atingida tantas vezes por outros e eu a aprecio tanto?
Eu sei que as histórias já foram todas inventadas, simplesmente há sempre quem as escreva provando aquilo que sempre soubemos: a história é o que menos importa num livro. Na verdade, não importa de todo. Tudo o resto é que faz de alguém bom escritor, bom artista. Já são raras aquelas letras de música que sem a melodia eram uma obra de arte por si só. O Vinicius era assim, ainda hoje o leio como o poeta que é, tantas vezes, antes de dormir, antes de sair de casa, só para pensar nisso durante o dia.
Assim resigno-me ao facto de que hei de ser sempre uma escritora medíocre mas que vai esforçar-se sempre por fazer melhor e vai sempre apreciar o que se fizer de melhor...

Talvez devesse começar já por apagar este texto...